quarta-feira, 8 de abril de 2015

O Futebol é.


“São só 22 parvos a correr atrás de uma bola” O desdém de quem não o ama converge invariavelmente nesta subjectiva apreciação. Pois bem, se há algo que nos torna diferentes dos animais é a capacidade de pensar racionalmente, mas nem por isso devemos negar as paixões que nos atingem, mesmo que seja um desporto. O Mundo seria uma valente seca se ponderássemos as nossas acções até ao mais ínfimo pormenor. É por isso que o Futebol mexe comigo. É o anticorpo desse pragmatismo exacerbado. É fundamentalmente paixão. Pode ser amargo na derrota e doce na vitória. Mas também é saber respeitar quando se ganha e ganhar o máximo com a derrota. É muita frustração, mas muito mais prazer. É o casamento vitalício da técnica, do físico e da mente. É suor e lágrimas. É suor e gargalhadas. Vai da tristeza à alegria tão depressa como o oposto. É a vitória suada e a derrota bem vendida. É os minutos no banco, os golos de levantar o estádio. É o treino e o jogo. É camaradagem, entreajuda e cumplicidade. É uma máquina que requer todas as peças. É a inexactidão e a imprevisibilidade. É sujo e quezilento. É transversal do Zé Povinho às elites.  É falível porque é humano. É sentimentos, é extremamente humano. Mexe e remexe dentro de cada um que o ama. O Futebol também não é muita coisa. Não é 22 parvos a correr atrás de uma bola. E isso é tanto.

Mas se as paixões são o ópio de quem tão pouco escreve, também esta metalinguagem é perigosamente incapaz de pintar a explosão de emoções que o desporto mais praticado do Mundo oferece. O Futebol é amor e desamor às mãos do golo.


segunda-feira, 6 de abril de 2015

A sós somos, acompanhados tentamos ser.


Badalava o sino da Igreja, eram cinco da tarde. O pobre coitado, esbaforido de nada fazer, pegou na chave do velhote Opel Corsa, mais velho do que ele próprio, e começou a conduzir. Não sabia para onde ia, embora soubesse que não ia longe. Não foi ver o mar, não foi ao café, não foi ter com amigos. Limitou-se a guiar vagarosamente, seguindo por uma estrada de terra batida e decidiu parar o automóvel em terras de ninguém, bem no meio, onde a vista não alcançava o limite da mundanidade. A improbabilidade do local excitava-o. Excitava-lhe a liberdade que dispunha naquele momento para gritar bem alto que o céu era amarelo torrado, para vestir os boxers por cima das calças (pensar no super-homem não só suaviza como infere um carácter épico à imagem) ou para atirar pedras o mais longe que conseguisse. Ninguém o iria ver, também ninguém o julgaria por atitudes tão parvas. A verdade é que o rapaz não fez nada disso, apenas se sentou numa pedra laja e assistiu à partida do sol, lentamente, lá longe. Enquanto o Sol não caía de vez nos confins do Mundo, o jovem ia reflectindo sobre aquela pornografia de estar sozinho. A improbabilidade daquele sitio, àquela hora. Agradava-lhe a liberdade de tomar as suas próprias decisões, sem estar sujeito à aprovação de segundos. Imenso! Encontrou na solitude a autenticidade não só da palavra bem como do sentimento. Era a exclamação do estar sozinho que provocava as reflexões autónomas e genuínas, sem medo dos desavindos. É naquele momento que os actos ganham vontade própria, que se desprovem de exibicionismos baratos, que são autênticos. Somos nós, a viver.