terça-feira, 20 de outubro de 2015

ELA


Ela é loira mas não é aquela loira perfeita idealizada pelos homens. Isso não existe. Nem entre as loiras, nem entre as morenas muito menos entre as ruivas. Mas tem as imperfeições mais bonitas deste Mundo. Os sinais, o sorriso tímido, o andar singular. E os olhos claros são o espelho de uma alma delicada que respira autenticidade. Observa mais do que opina, ri mais do que chora.
Ela não é perfeita porque a perfeição não existe, e não existe porque o ser humano tenta sempre mais do que tem, e do que pode vir a ter. E se não é linda e quase perfeita aquela que se fica por uns all-star e umas jeans, a mais pomposa e produzida não será de certeza. Ela encanta-me porque casa a singularidade dos gestos com a simplicidade do indispensável. E desenganem-me se estiver errado, mas a beleza não é sentida nas trivialidades, mas antes nos elementos orgânicos inerentes ao Homem.
Ela tem um rosto muito pouco carregado. É leve, é tranquilo, mas pode ser só fruto da ingenuidade que lhe aligeira a vida e a torna mais bela. A ela e à própria vida. E o rosto, por ser belo, por ser único, e sobretudo por deixar-me instantaneamente sem fôlego, não consigo descrever mais do que o fiz. Porque o que é para mim, pode não o ser para outrem e na verdade ninguém consegue explicar a razão de todas as mães serem as melhores do Mundo.
Ela pode ser tudo necessidade e mentira dos meus olhos parcos em amor, deste coração que sente tão pouco, sentir desta forma tão intensa a beleza de quem só o nome conheço. Mas o instinto raramente se despega da razão, ora não coabitassem eles no mesmo individuo. O que seria do homem se sentisse e não agisse ou, por outro lado, agisse sem sentir? Frustração e Vazio.

Ela, mas e se ela for tudo o que quero, será que posso chamá-la perfeita?


domingo, 21 de junho de 2015

É desamor


Houve em tempos quem cantasse o amor como o fogo que arde e que não se vê. Intenso e profundo, sem pedir licença ao Mundo. É a catástrofe shakespeariana quando o amor não é amor, e o fogo queima de fora para dentro, reduzindo a cinzas tudo aquilo que o propaga. Não se ama, procrastina-se o desejo. É a certeza do que não se quer e do que se pretende ter - tão pouco e tão tudo - mas a incerteza do que se tem. E é o silêncio imputado que mais fere o coração que o corpo deu voz, para sentir tudo aquilo que foi e provavelmente nunca mais será. Floresce o desejo mas desama-se aos olhos de quem pouco sente.
É o desejo de quem não pode ter, a vontade de tocar onde não se pode. Afinal ainda há crianças em todos nós. Pobres crianças que não sabem a dificuldade de amar, de querer, ter, e mesmo assim chorar. Que seja Desamor.



quarta-feira, 8 de abril de 2015

O Futebol é.


“São só 22 parvos a correr atrás de uma bola” O desdém de quem não o ama converge invariavelmente nesta subjectiva apreciação. Pois bem, se há algo que nos torna diferentes dos animais é a capacidade de pensar racionalmente, mas nem por isso devemos negar as paixões que nos atingem, mesmo que seja um desporto. O Mundo seria uma valente seca se ponderássemos as nossas acções até ao mais ínfimo pormenor. É por isso que o Futebol mexe comigo. É o anticorpo desse pragmatismo exacerbado. É fundamentalmente paixão. Pode ser amargo na derrota e doce na vitória. Mas também é saber respeitar quando se ganha e ganhar o máximo com a derrota. É muita frustração, mas muito mais prazer. É o casamento vitalício da técnica, do físico e da mente. É suor e lágrimas. É suor e gargalhadas. Vai da tristeza à alegria tão depressa como o oposto. É a vitória suada e a derrota bem vendida. É os minutos no banco, os golos de levantar o estádio. É o treino e o jogo. É camaradagem, entreajuda e cumplicidade. É uma máquina que requer todas as peças. É a inexactidão e a imprevisibilidade. É sujo e quezilento. É transversal do Zé Povinho às elites.  É falível porque é humano. É sentimentos, é extremamente humano. Mexe e remexe dentro de cada um que o ama. O Futebol também não é muita coisa. Não é 22 parvos a correr atrás de uma bola. E isso é tanto.

Mas se as paixões são o ópio de quem tão pouco escreve, também esta metalinguagem é perigosamente incapaz de pintar a explosão de emoções que o desporto mais praticado do Mundo oferece. O Futebol é amor e desamor às mãos do golo.


segunda-feira, 6 de abril de 2015

A sós somos, acompanhados tentamos ser.


Badalava o sino da Igreja, eram cinco da tarde. O pobre coitado, esbaforido de nada fazer, pegou na chave do velhote Opel Corsa, mais velho do que ele próprio, e começou a conduzir. Não sabia para onde ia, embora soubesse que não ia longe. Não foi ver o mar, não foi ao café, não foi ter com amigos. Limitou-se a guiar vagarosamente, seguindo por uma estrada de terra batida e decidiu parar o automóvel em terras de ninguém, bem no meio, onde a vista não alcançava o limite da mundanidade. A improbabilidade do local excitava-o. Excitava-lhe a liberdade que dispunha naquele momento para gritar bem alto que o céu era amarelo torrado, para vestir os boxers por cima das calças (pensar no super-homem não só suaviza como infere um carácter épico à imagem) ou para atirar pedras o mais longe que conseguisse. Ninguém o iria ver, também ninguém o julgaria por atitudes tão parvas. A verdade é que o rapaz não fez nada disso, apenas se sentou numa pedra laja e assistiu à partida do sol, lentamente, lá longe. Enquanto o Sol não caía de vez nos confins do Mundo, o jovem ia reflectindo sobre aquela pornografia de estar sozinho. A improbabilidade daquele sitio, àquela hora. Agradava-lhe a liberdade de tomar as suas próprias decisões, sem estar sujeito à aprovação de segundos. Imenso! Encontrou na solitude a autenticidade não só da palavra bem como do sentimento. Era a exclamação do estar sozinho que provocava as reflexões autónomas e genuínas, sem medo dos desavindos. É naquele momento que os actos ganham vontade própria, que se desprovem de exibicionismos baratos, que são autênticos. Somos nós, a viver.


segunda-feira, 30 de março de 2015

Devíamos ser todos Mujica!


Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Foi a chapinhar os pés em água a ferver que José “Pepe” Mujica, ex-presidente Uruguaio, idealizou a problemática da legalização das drogas leves.

Mujica explicou em várias entrevistas que deu não considerar o consumo de drogas, ainda que leves, a situação ideal. Porém, pior que um vício como tantos outros que auferem o título da legalidade, é o narcotráfico e as situações conseguintes deste flagelo. Já pararam para imaginar quantas redes criminosas subsistem com a venda de drogas?

Introduzindo um estrangeirismo, a legalização dos canabinóides em Portugal seria uma win-win situation. Não era óptimo se o nosso governo ganhasse 23% cada vez que drogas eram vendidas? Não era óptimo pedir gentilmente umas pequenas contribuições autárquicas a quem abrisse uma coffee shop? Não era óptimo que essa pessoa precisasse de mil e um trâmites legais para abrir a dita coffee shop? Já para não falar das oportunidades que a ASAE teria para multar por incumprimentos das mais variadas ordens. Isto só para ti, Estado.

Para as pessoas, essas miseráveis e asquerosas criaturas, só garantia a qualidade do produto para quem consome, só aliviava a dor de pessoas com doenças terminais, só divertia pessoas com mais de 18 anos, responsáveis pelos seus actos ou só providenciava uma absurda diferença de segurança no momento da compra.

Isto tudo com calma, nada de bares abertos. Para legalizar não significar o incremento do consumo, tal como no Uruguai as vendas seriam obviamente controladas e limitadas. Acho até que a legalização dissuadiria muitas pessoas, sobretudo jovens, de consumir. Não fosse “o fruto proibido o mais apetecido”.

Assim como Pepe Mujica, que não imagino a consumir drogas leves junto das suas galinhas aos 79 anos, também eu, estudante universitário aos 21, não o faço. Por incrível que pareça. É a opinião do pragmatismo, o abandono dos tradicionalismos.


Mais sobre Pepe Mujica em: https://palavrasaoposte.wordpress.com/2015/03/18/gracias-pepe-mujica/




quinta-feira, 5 de março de 2015

“Sr. Darwin, o seu bilhete por favor.”



É naturalmente conhecida por todos a fantástica história do “Capuchinho Vermelho e o Lobo Mau”. No entanto, nada da experiência que vos relatarei de seguida está relacionada com ela. Era só para provocar uma falsa sensação de familiarização com o tema.
A ocorrência deu-se esta tarde no comboio Intercidades quando avistei dois espécimes em tudo semelhantes a lontras, excepto no tamanho. Estas gozavam de um porte muito mais digno para exibição num zoológico. Até porque com estas dimensões, suponho eu, já não devem existir muitos exemplares e o nosso ecossistema necessita de todas as espécies para o seu bom funcionamento, até aquelas que ninguém lhes pega. Isto não pode ser só fait divers com coalas e pandas e as outras espécies que se lixem.
Fiquei tão impressionado com a exoticidade destas criaturas que até receei tocar. Chegar perto inclusive. A experiência tornou-se mais incrível quando notei que com elas transportavam um tapete, também ele grande. Primeiro pensei que fosse esse o seu modo de locomoção – dada a raridade da espécie não sabia o que esperar – mas após um exausto exercício mental cheguei à conclusão que nem o tapete do Aladino levantaria voo com todas aquelas arrobas de criatura em extinção. Entretanto, para mal dos meus pecados – e nem sou religioso –, as magnânimas espécies desceram do comboio, deixando-me visivelmente embaraçado, pois acabara de contactar a reserva do parque natural para um parecer mais profissional acerca do assunto e agora teria de voltar a fazê-lo, mas para dar conta da sua fuga e de como não fui capaz de evitá-la. Ainda a bordo, e apesar da opulência física, as criaturas mostraram-se animadas e portadoras de um sentido de humor apurado, exemplo que eram as suas intrépidas gargalhadas enquanto retraçavam empenhadamente um pacote de Doritos.
Bem, isto tudo para dizer que a natureza é uma coisa muito séria com a qual não se deve brincar. Antes pelo contrário, ser-se amigo, muito amigo!



terça-feira, 3 de março de 2015

Um Dia Bom


Imagina-te descansado a dormir, sonhando com uma invasão alienígena que extinguiria toda a espécie humana, e de repente o sol bate-te na cara e começas a ouvir um barulho ensurdecedor que faz lembrar um aspirador. Primeiro pensas que é o aproximar da arma apocalíptica, mas depois percebes que é a tua mãe que entrou pelo quarto a dentro, a aspirar. Naquele que era o teu dia de folga, depois daquela semana intensa de trabalho e que a única coisa planeada era ir à bola. Haverá melhor maneira de começar um dia? Duvido. E foi assim que começou o dia do sortudo Vítor. Alegou a mãe do próprio que um afazer nas finanças carecia da máxima celeridade. Acordou, tomou banho e a meio da lavagem acaba-se o gás. Nesse mesmo instante, com a pele engelhada e os dentes tilintando sai da banheira para atender o telemóvel. Era o chefe, afinal precisava dele porque a Olivia teve um esgotamento nervoso causado pelo enteado que vive lá em casa desde os 3 anos após o abandono dos pais e que aos 43 continua solteiro.
O S. Pedro não estava de bons modos e chorou a manhã inteira. Quando o Vítor estava a sair de casa, um carro passa a arrasar o passeio e jorra para o jovem uma quantidade considerável de água. A suficiente para fazê-lo regressar a casa e trocar a indumentária. Seguiu então depois para a repartição de finanças. Lesta como a conhecemos, aquando da iminente chamada da sua senha, está à sua frente um velho de 86 anos, que ouve mal, é rabugento e é o típico pergunta-tudo. Ao paciente funcionário público, até sobre o prato do dia na tasca do Salustiano indagou.
Depois da jornada à nobre repartição, dirige-se ao local de trabalho, onde é informado que afinal a Olivia preferiu ir trabalhar para evitar o enteado e que assim já não precisavam dele. Pediram desculpa por não ligar a avisar. Ao menos isso.
Já no metro, tímidos gases provocados pela feijoada à transmontana que almoçou na tasca do Salustiano porque ouviu o paciente funcionário público dizer ao velho rabugento que era esse o prato do dia e teve vontade de lá ir, iam assolando a carruagem de um aroma só agradável aos mais sádicos. Mal chegou a casa, também potenciado pelo efeito laxante do café que havia bebido, dirigiu-se imediatamente ao trono (Era assim que chamava a sanita). Tal era a pressa de expelir tão notável quantidade de merda, nem verificou a existência de papel. E não havia. Chamou pela mãe, no entanto a dócil progenitora havia saído para comprar um filtro novo para o aspirador. De calças descidas a meia-canela e nalgas o mais afastadas possível, caminhou cautelosamente até à dispensa, perto da porta de entrada, com pretensões de obter um novo rolo. Nisto, e inesperadamente, entra a irmã e o namorado em casa. Boa tarde pareceu-lhe a saudação mais indicada, e retornou à casa de banho, no mesmo quadro de miséria em que tinha saído dela, desta feita de rolo em punho, e terminou o que ainda não havia começado.
Quando o dia até lhe estava de feição, e se preparava para descansar no sofá, sobejamente bem acompanhado pelas “Tardes da Júlia”, eis que começa a ouvir gemidos de prazer provenientes do quarto da irmã. Pensou em fazer muita coisa, mas como nada é como nos filmes apenas pegou nas chaves de casa e saiu. Desceu a avenida e decide entrar no Starbucks. Dado o calor desgraçado que se fazia sentir, pediu um frappuccino de caramelo mas a Cristina “botinhas” da Escola Primária reconheceu-o e, para se vingar de todas as vezes em que o Vítor gozou com as suas botas ortopédicas, serviu-lhe um expresso bem amargo. Surpreendentemente, o Vítor nem se importou, já que a Cristina escreveu Vítor com ‘c’ e aludir a essa monstruosa patacoada na língua portuguesa era a descrição perfeita e deveras mais original para a foto que já havia pensado tirar ao copo para postar no instagram. Contudo, o talão não trazia a password de wi-fi e como era fim do mês, os dados móveis estavam esgotados. Decidiu então ir perguntar precisamente à Cristina pela password, isto porque ela agora até tinha umas boas mamas e o aparelho já era passado. Ela, obviamente, ávida de vingança, forneceu a password errada. O Vítor começou a juntar as peças do puzzle e rapidamente chegou à conclusão que a culpa era muito provavelmente daquele velho Sony Xperia que já tinha fazia um ano no mês que vinha. Deu o murro na mesa. Bateu punho. Pelo meio derramou o seu expresso, mas que se foda o expresso, ele ia comprar um Iphone! Lá foi. Já no estádio da Luz, tirou a sua primeira foto que serviu para atestar a qualidade do engenho. Após redimensionar no instasize, colocar o filtro, ajustar a luminosidade e o contraste, e postar no instagram com partilha no facebook o jogo já levava 8 minutos e o Artur ainda não tinha feito nenhuma asneira entre os postes. Ainda.
Infelizmente, o Benfica perdeu.
Chegado a casa, ao jantar, o pai pergunta-lhe:
- Então filho, como correu o teu dia?
- Nem foi mau, só tenho pena do Benfica ter perdido.
- Deixa lá filho, importa é ter saúde.





sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Anxietatem Amoris


Gostava que o amor fosse música. Gostava que o amor fosse uma partitura composta tão livremente assim o desejo do compositor. Os músicos seríamos nós,  os demasiado inconscientes para compreender a ausência do livre-arbítrio. Tocaríamos o alinhamento, exultaríamos alegrias, choraríamos tristezas. Sem o pesar de quem apenas vive, com a soberania sobejamente reconhecida a um espectáculo de marionetas.

A nossa música é diabólica, sem qualquer tipo de rigor ou criatividade, de vontade parca e qualidade duvidosa. A letra está incompleta, o ritmo indefinido e a história por acabar. Mal existimos. Espero e desespero por conhecer o género. A minha preferência é Rock ligeiro, tipicamente música de nicho em que o gostar é venerar, porém as probabilidades recaem sobre uma amorfa, exasperante e recorrente balada de amor. A verdade é que o amor catalisa a loucura e não há nada mais autêntico neste Mundo que a loucura perpetrada por aqueles que amam. Venha de lá então essa balada, afinal não é o amor que nos move? De que serve o dinheiro se não temos companhia para gastá-lo? De que serve a saúde sem alguém com quem partilhar a vida? Sei tão pouco sobre ti que nem faço ideia das quantidades que tens destas coisas. Mas gosto do teu sorriso. É autenticamente bonito. Faz-me sorrir.

Há muito que te espero, já pensei que eras tu as vezes suficientes, mas a inexorabilidade do destino dita mais uma espera. Espero que seja desta. Procuro-te vertiginosamente nos espaços moribundos da libido feminina que me atraem tão rapidamente como me repudiam, quero sair enquanto quero ficar, tudo é anti-matéria. Em pleno rodopio, fico sem saber para onde ir, não te vejo. Nunca. A ansiedade aumenta. Mata-me e esfola-me, revela as fraquezas, fode a cabeça e o coração vai atrás. Quero-te a ti. Não sou de muitas, sou de ti. Não sou de muitas porque não posso, quero ser de ti porque acredito no amor. É contigo que quero ser, sem a contenda entre a cabeça e o coração, sem desejos que tanto têm de transitórios como de estéreis. Quero preencher esta parte viciosa da vida, a melhor parte, a mais romântica mas a mais luxuriosa, o amor e o desejo, nós e nós.
Quem és? Não sei, mas existes.



quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

O Segundo Capítulo - Au revoir et bonne chance, Bernardo.


É no país dos Românticos que Bernardo dá os seus primeiros passos, mas parece que são os benfiquistas quem têm amor para dar e vender. Após o anúncio da venda de Bernardo era deveras expectável manifestações de descontentamento mas nunca antes se assistiu a tamanha revolta despoletada pela venda de um jogador (Incrivelmente, nem a de Garay!). Também eu li a noticia da venda definitiva do Messi do Seixal com tristeza. Mas vou contar-vos um segredo: O mundo não acaba!

Não acaba sobretudo para um Benfica que continua com 6 pontos de vantagem para o segundo no campeonato português, que tem o melhor treinador em Portugal e que conta nas suas fileiras com dois génios, comummente chamados de Gaitán e Jonas. Ah, e não esqueçamos: 15M fresquinhos na sua conta bancária.

Se alguma vez o futebol foi entendido como o supra-sumo das histórias de encantar, agora já não o é. E o amor à camisola acabará quando o Gerrard for rodar filmes para a América e o Totti assumir de vez a liderança da máfia Romana.

Todo o adepto benfiquista espera – e desespera – por uma equipa 100% ‘made in Seixal”. Porém, nem todo o adepto tem as faculdades mentais em tal percentagem. Se as tivesse, olharia sete pontos para baixo na tabela classificativa, ou para o outro lado da segunda circular – tanto faz – e veria que a sobranceria perpetrada por aqueles que possuem uma equipa em grande parte ‘home made’ em pouco resulta. Para eles os títulos são acessórios, os panegíricos à academia são regra.

A qualidade de Bernardo Silva é inquestionável, adoro aquele pé esquerdo que pisa delicadamente cada metro quadrado de relva. No entanto, quando o Futebol é o assunto, dou primazia ao pragmatismo no lugar de um romantismo exacerbado. E se não é pragmatismo vender um activo com apenas vinte anos e meia hora de águia ao peito na equipa principal por 15M, então dêem-me uma definição melhor da palavra.

Para ser pragmático, dou-vos o exemplo de Rodrigo e Cristante. Ambos adquiridos por cifras entre os 5 e 6M, que tantas dúvidas suscitaram. “Tantos milhões por um júnior”, “Esta direcção está maluca”. Foram estas, num tom abreviativo, as criticas a estas contratações. Pois bem, se 5 ou 6M é demasiado para dar aos outros, o que serão 15M nos nossos cofres?

co·e·rên·ci·a 
substantivo feminino
1. [Física]  Recíproca aderência que têm entre si todas as partes de um corpo.
2. [Figurado]  Conformidade entre factos ou ideias.
3. Nexo, conexão.

“Mas ele tem uma tatuagem do Benfica”, “Mas ele foi ver todos os jogos na época passada em que se sagramos campeões”.Um grande e respeitoso Benfiquista, que por acaso é futebolista. A ignóbil verdade é que ao singrar na equipa A, a sua saída seria, mais tarde ou mais cedo inevitável, face ao que é o valor de mercado do jogador português e à qualidade inerente ao sicrano. Espero não ter despedaçado o coração de algum romântico.

Não me revejo no ‘Vieirismo’, mas revejo-me ainda menos em papagaios intentados em estalar o cisma dentro do clube que amo. A aposta na formação está inexoravelmente ligada a Vieira e os resultados práticos, vulgo, a presença de jogadores na equipa principal, só ainda não estabilizaram devido à morosidade do processo e à exigência de Jorge Jesus. E o único erro de Vieira é dizer aquilo que não tem assegurado, para contentar os adeptos. Não sei se é legítimo, mas menos legítimo ainda é acusá-lo de querer prejudicar o Benfica quando os resultados dos seus mandatos são visíveis. Ainda sobre a formação, podíamos lançar os miúdos todos às feras, mas nem eles evoluiriam, nem o Benfica ganharia títulos. A aposta na formação tem de ter raízes fortes e estruturas que promovam a sustentabilidade do projecto. Nem 8 nem 80. Nem o Benfica sem portugueses, nem o Benfica sem títulos.

Sobre Bernardo, tenho pena. Tenho pena de ver partir o capitão daquela equipa fantástica de Juniores e que outrora disputou comigo uma partida de snooker na Faculdade de Letras.

Au Revoir et Bonne Chance, Bernardo.


“Bernardo Silva – O Primeiro Capitulo” em 2013 - http://lastbutnotleast10.blogspot.pt/2013/12/bernardo-silva-o-primeiro-capitulo.html