domingo, 30 de março de 2014
Mórbido Martírio
Não é fácil. Sempre foi difícil para mim ver aquilo que quero negado, quando era tão fácil de ter, de tocar. É fácil quando o que quero e não posso ter está no metro, no autocarro, no comboio, na rua. A efemeridade do momento faz-me sonhar, mas num fogacho acordo do sonho, tenho que sair nesta paragem ou correr para a aula que já começou. Mas contigo não é fácil.
Desaparece, sai de mim, anula aquela cadeira. Sonhar duas vezes por semana é exasperante, ainda para mais quando o final está escrito. O que quero, o que quero muito, raramente consigo. Por isso sabes, quero-te muito. Desde a primeira vez que, pelo canto do olho, te vi entrar e sentar, arrogante. A arrogância - em especial a tua - espicaça-me o ego e diviniza-te, aos meus olhos, ainda mais como o inalcançável. Sai.Sai.
Se não saíres, deixa-me tocar-te, falar contigo, não negues com esse olhar o que tanto desejo. As palavras serão minhas, mas só as direi quando, involuntariamente, me pedires. Dá-me um sinal. Pisca-me o olho, sorri para mim, senta-te ao meu lado, mas fá-lo discretamente, mantêm a chama da rejeição.
Ou então não faças nada, não alimentes mais o sonho. Eu faço, porque se for para destruir outro sonho, que seja eu a fazê-lo, ei de parar até deixar de doer.
A aula já começou e vou a correr por ti.
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